10 ações que podem salvar a Terra
(Eduardo Araia E Luis Pellegrini - Revista Isto É)
Será possível inverter as tendências que poderão levar – num tempo cada vez mais curto – a uma catástrofe ecológica total? O desafio é muito importante neste início de século, pois o próprio gênero humano está ameaçado de extinção. A Environment Agency – o mais importante braço do governo britânico para as questões ambientais – convocou um grande painel de especialistas para discutir a questão e elaborar uma lista do que fazer para salvar a Terra. A lista – cujos itens mais essenciais comentamos a seguir – contém sugestões para governos, empresas, formadores de opinião, cientistas e outros. Inclui também ações que cada um de nós pode executar no dia-a-dia. O futuro do planeta – e o nosso próprio – depende de algumas mudanças em nossos hábitos de vida, em nossa maneira de pensar e no modo como nos relacionarmos com o mundo, com os outros e com nós mesmos.
1-ENERGIA: O GRANDE DESAFIO
A questão da energia encabeça todas as listas de ações prioritárias a serem desencadeadas para a salvaguarda do planeta. Nossa civilização se tornou uma insaciável vampira de energia (sobretudo a elétrica), e a consome muitas vezes de forma desnecessária e perdulária – os feéricos letreiros de Las Vegas que o digam. Enquanto isso, produzi-la implica, em muitos países, queimar petróleo ou carvão, combustíveis fósseis altamente poluidores. A maioria dos especialistas afirma que reduzir esse consumo é prioritário, urgente e perfeitamente possível. Podemos começar pelo nosso próprio lar.
Os eletrodomésticos têm ampliado enormemente nossas possibilidades de cultura e lazer, e a tendência é que os lares acumulem um número cada vez maior desses aparelhos. Para amenizar o impacto no consumo de energia, porém, é preciso investir em equipamentos elétricos com a maior eficiência energética possível. Um item relevante: a posição stand by – aquela em que o aparelho supostamente está desligado, mas continua a consumir energia – deve desaparecer. Se o número de aparelhos na casa em stand by for grande, a conta de luz pode aumentar até 25% num mês.
Cada vez mais, será preciso investir em energias renováveis. Dentre elas, a que tem mais futuro, dizem os especialistas, é a solar: a fonte se manterá por mais alguns bilhões de anos, está disponível em praticamente toda a Terra e, característica fundamental, não polui.
Mas as outras formas de energia renovável não devem ser desprezadas – a eólica, a de biomassa, a hidráulica, a energia das ondas marítimas, a energia geotérmica, etc. Basta aproveitá-las onde forem mais viáveis em termos econômicos e ambientais.
Quanto à energia nuclear, ela é, de fato, uma das menos poluentes, mas os riscos que seu uso implica são tão grandes que assustam – basta lembrar a tragédia de Chernobyl. Pelo sim, pelo não, a tendência é investir nessa alternativa só em última instância.
Um domicílio não poderia também gerar energia? Em certos países, a resposta a essa questão já é afirmativa – e ambientalmente aprovada. Para tanto, é preciso que a produção e a distribuição de energia não estejam nas mãos da mesma empresa. Com isso, os proprietários dos imóveis poderiam instalar instrumentos de geração de energia em pequena escala, com relação custo-benefício que torne o negócio viável. Na Grã-Bretanha e em vários outros países da Europa começa a se espalhar o conceito de casas em que parte do telhado é ocupada por painéis solares. Dependendo do local, outras formas de energia podem ser aproveitadas.
Para disseminar essa idéia, uma boa opção é a obrigatoriedade. Em Israel, a instalação de aquecedores solares é compulsória desde 1980. No início deste ano, a Prefeitura de São Paulo obrigou todas as novas edificações a instalar um sistema de aquecimento solar que deverá atender a pelo menos 40% da demanda anual de água aquecida consumida por usuário.
2-FORMAR UMA CONSCIÊNCIA AMBIENTALFormadores de opinião – professores, líderes religiosos, artistas, jornalistas e comunicadores em geral – estão sendo convocados a trabalhar na elaboração de uma consciência ambiental individual e coletiva. A razão disso é que uma ação ambiental só consegue ser implantada e perdurar se for atingido um “número crítico” de cidadãos conscientes de seus deveres e responsabilidades quanto à restauração e à manutenção do equilíbrio ecológico.
Um exemplo disso está no recente aprofundamento da calha do rio Tietê, em São Paulo. Durante a obra, retiraram- se do leito do rio milhares de toneladas de detritos atirados pela população. A limpeza trouxe conseqüências positivas, a começar pela redução das enchentes. Mas, como a formação de consciência ambiental dos cidadãos não foi concluída, muitos recomeçaram a fazer do Tietê sua lixeira particular.
Os professores, por seu lado, respondem pela educação ambiental dos alunos. Ela deverá estimular nos estudantes uma sensibilidade particular aos problemas ligados ao ambiente. A chave do processo é a criação de uma cultura que transforme a visão antropocêntrica da relação homem/ natureza em visão biocêntrica – que não mais considera o homem como o centro de tudo, mas, apenas, como um dos muitos componentes da biosfera.
Já os líderes religiosos deverão fazer das questões planetárias a prioridade número 1 de seu discurso e encorajar seus seguidores a se tornar exemplos para o resto da população. A crença de que é moralmente errado agredir a natureza, aliás, está na base ética de vários sistemas religiosos.A responsabilidade pela formação de uma consciência ambiental transcende os limites dos formadores de opinião: na nova ética ecológica, é dever de todo cidadão bem informado tornar-se vetor de elucidação daqueles que ainda não desenvolveram essa consciência.
3-OBTER UM NOVO E MAIS PODEROSO PROTOCOLO DE KYOTOO esforço de salvar a Terra envolve todos os países, já que os efeitos do desequilíbrio ambiental não respeitam cercas ou fronteiras. Nesse sentido, é urgente acertar um novo tratado na esteira do que foi assinado em Kyoto (Japão), em 1998, cuja proposta era obrigar os países desenvolvidos a, no período entre 2008 e 2012, reduzir a emissão de gases do efeito estufa em pelo menos 5,2%, ante os níveis de 1990. Desta vez, porém, é essencial que o novo acordo tenha maior poder coercitivo, enquadrando os principais poluidores – os Estados Unidos à frente – e definindo metas para todos, inclusive os países em desenvolvimento com ficha ambiental desabonadora e antes desobrigados de seguir objetivos, como China, Índia e Brasil.
Os índices de redução da emissão de gases do efeito estufa também devem ser drasticamente revistos no novo tratado. Já se fala hoje em cortes de até 80% das emissões de CO2 até 2050. O compromisso deve ser assumido não só por governos, mas também por indivíduos, empresários, ONGs e outros setores. E todos os mecanismos disponíveis devem ser empregados para esse fim, incluindo-se aí novas leis ambientais, campanhas de esclarecimento, comércio de emissões de carbono e políticas fiscais.
Obter um tratado ambiental planetário eficiente parece ser o grande desafio da humanidade neste início de milênio. Se ele não for implementado e cumprido, a saúde do planeta estará correndo sério risco.
4-ESTIMULAR A VENDA DE PRODUTOS “VERDES”Produzir mercadorias mais adequadas ambientalmente sai, em geral, mais caro do que as tradicionais, e essa diferença de preço é o maior empecilho para a expansão do mercado “verde”. Para os especialistas, uma política fiscal específica poderia mudar bastante esse quadro, tanto reduzindo impostos e taxas que incidem sobre os produtos ambientalmente adequados como aumentando os relativos às demais mercadorias – ou elaborando uma combinação das duas alternativas. Colocar produtos “verdes” e convencionais em condições semelhantes de disputa, dizem eles, deve levar o consumidor a refletir mais sobre o que está adquirindo.
Lâmpadas, aparelhos elétricos e veículos estariam entre os primeiros setores atingidos por essas medidas. As lâmpadas fluorescentes compactas, por exemplo (85% mais econômicas do que as incandescentes), poderiam ser barateadas com a eliminação de impostos. Já os pesados, beberrões e poluentes utilitários esportivos seriam sobretaxados.
Outras medidas incluem dar muita publicidade às vantagens ambientais que os produtos “verdes” representam e subsídio ou redução de encargos a empresas e produtores que investem nessas mercadorias.
5-REDUZIR O USO DE COMBUSTÍVEIS FÓSSEIS, AUMENTAR O DE BIOCOMBUSTÍVEISNas atuais proporções, os efeitos ambientais do consumo de combustíveis fósseis são catastróficos. É preciso não apenas reduzir o uso desses combustíveis, mas também substituí- los, tanto quanto possível, por outras alternativas. A primeira parte pode ser obtida, por exemplo, diminuindo o consumo da energia gerada por termelétricas que recorrem a esses insumos (o apagão brasileiro mostrou que é possível conseguir redução geral de 20%). Por outro lado, a geração de eletricidade pode ser feita por fontes renováveis, inclusive em nível doméstico. E até o setor petroquímico pode ser revisto: é possível, por exemplo, obter plástico a partir de etanol.
Na confusão mundial envolvendo os biocombustíveis, a cana-deaçúcar é hoje uma exceção à regra. Enquanto os Estados Unidos, por exemplo, obtêm o etanol a partir do milho, o Brasil o obtém a partir da cana. No geral, no resto do mundo, as safras agrícolas usadas na produção de biocombustíveis têm apenas uma fração de seu valor energético aproveitado. Como os biocombustíveis continuam a ser vistos como ferramenta importante contra a emissão de gases do efeito estufa, os países que não podem plantar cana têm de aperfeiçoar as tecnologias destinadas a aproveitar a celulose das plantas – algo previsto para ocorrer em até dez anos.
6-COMPRAR MENOS E MELHORA mentalidade consumista está assentada na criação e manutenção do que os especialistas chamam de “febre aquisitiva” – a compulsão de comprar e consumir. É necessário comprar apenas o essencial. E comprar bem. Por exemplo, adquirir produtos que não recorrem a embalagens caras e são feitos em condições dignas de trabalho. Em todo o mundo se implanta o “comércio justo” (fair trade, em inglês), uma forma de atividade comercial na qual o objetivo primário não é a hipertrofia do lucro, mas a luta contra a exploração do trabalhador e a pobreza ligada a causas políticas, econômicas ou sociais. A isso se acrescenta a luta contra formas comerciais que prejudicam o meio ambiente. O comércio justo ganha força e logo se tornará regra básica das transações comerciais no mundo.
Os especialistas também recomendam que o consumidor veja com carinho os artigos de segunda mão. Sebos e brechós mostram que o objeto não precisa ser novo em folha para cumprir sua missão básica.
7-REVER O TRANSPORTE COLETIVOCongestionamento no trânsito é sinônimo, entre outras coisas, de aumento de poluição (nessa condição, os veículos emitem mais poluentes do que o normal) e deterioração da saúde. Já existem diversas opções em uso ou análise para mudar isso.
Em primeiro lugar, o transporte coletivo precisa ficar atraente – sobretudo, mais rápido e confortável – para o usuário do automóvel. No caso de cidades como São Paulo e Rio de Janeiro, por exemplo, é fundamental expandir a rede de metrô e aprimorar as linhas de trens urbanos. Ônibus mais novos (mais confortáveis e menos poluentes) poderiam circular em corredores específicos, que aumentariam sua velocidade média. Alternativas menos poluentes ao diesel consumido por esses veículos devem ser implementadas. O uso de bicicletas pode ser ampliado, e planos que permitam a integração de diferentes formas de transporte devem ser incentivados.
Medidas restritivas devem ser aplicadas contra os que usam o carro sem necessidade. Cidades européias adotaram, por exemplo, o pedágio urbano em áreas mais congestionadas. Rodízios como o de São Paulo podem ser aprimorados a partir de uma vigilância maior sobre a circulação de veículos.O excesso de vôos para destinos próximos contribui substancialmente para a aviação representar 2% das emissões de CO2 originárias de atividades humanas. Com estradas e ferrovias ruins, o Brasil praticamente força os viajantes a usar o avião, mas no futuro se poderá optar por algo diferente, como o trem-bala que até 2014 deverá ligar São Paulo e Rio de Janeiro em cerca de 90 minutos.
8-ACABAR COM A CULTURA DO DESPERDÍCIOEm vários países, muita coisa já melhorou em termos de reciclagem, mas ainda estamos longe dos altos níveis necessários. Os mercados de artigos reciclados devem ser encorajados. Gradualmente, produtores são estimulados a recolher seus produtos ao final da vida útil deles para reciclá-los. No futuro, a reciclagem passará a fazer parte do próprio design dos artigos. Uma poderosa cultura de trocas e doação de objetos deverá ser implantada. Um exemplo: alguém muda o telhado de sua casa e fica com uma quantidade de telhas velhas, porém intactas, que oferece de graça em um site especializado; quem se interessar vai buscá-las.
9-CONTROLAR O AUMENTO POPULACIONALA população global deve atingir 11 bilhões ao redor de 2050. Assim, a necessidade de uma política populacional nunca foi tão urgente, da mesma forma que uma mudança radical da mentalidade até agora vigente na maior parte dos países em relação aos altos índices de crescimento populacional. Muitos governos persistem no erro de considerar grandes populações como indicadoras de poderio econômico. Se isso não for corrigido em escala global, esses índices crescerão cada vez mais, estimulando a proliferação de catástrofes ambientais.
10-PRESERVAR AS FLORESTAS TROPICAIS E A BIODIVERSIDADEAs florestas tropicais desempenham um papel fundamental na absorção de gases do efeito estufa e nos regimes de chuvas que afetam extensas áreas continentais. As regiões que as abrigam, porém, estão em países emergentes cujo conceito de desenvolvimento pode divergir bastante da preservação do meio ambiente. As opções para controlar isso são reduzidas. Uma possibilidade seria adotar medidas rígidas de fiscalização contra a madeira extraída ilegalmente ou até banir por completo o consumo de produtos que envolvam o corte de árvores dessas florestas. Outra alternativa é o reconhecimento, por parte dos países ricos (muitos dos quais se desenvolveram devastando florestas à vontade), de que os pobres precisam de verbas polpudas para defender suas florestas, e um acordo subseqüente que defina metas e gastos. Ao Brasil e a outros detentores de áreas de reservas tropicais cabe implantar um modelo de desenvolvimento em harmonia com o meio ambiente.
Por seu lado, a fauna e a flora ajudam a manter o equilíbrio e a estabilidade dos ecossistemas e estão na base de diversas atividades econômicas. Por isso, conservar a biodiversidade é fundamental para a sobrevivência da nossa espécie, e a tarefa começa com uma intensa campanha de conscientização a respeito de sua importância.
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